domingo, 14 de novembro de 2010

Arco-íris de anil

“Quem souber de alguma coisa venha logo me avisar
Sei que há um céu sobre essa chuva e um grito parado no ar.”
(Um grito parado no ar – Toquinho e Gianfrancesco Guarnieri)



As gotas de chuva escorregavam pela vidraça do apartamento. Batiam contra o vidro e deslizavam janela abaixo deixando seus rastros. Eram finos esguichos d’água ainda tímidos. Fiquei por um momento a contar as gotas quando me distrai com os raios do sol, igualmente tímidos, numa batalha travada com os pingos. Nesse cabo de guerra formado, quanto mais força colocavam, mais a corda se esticava. Uma corda colorida e arqueada de fora a fora.  
Dizem que o arco-íris tem sete cores. Nunca consegui enxergar mais do que seis. Vermelho, laranja, amarelo, verde, azul e violeta. Que diabo de cor é anil? Azul e anil são a mesma cor. Para falar a verdade, se completam. Existe o azul marinho, o azul petróleo, o azul anil. E nem por isso deixam de ser azul. Sentada ao pé da janela, ainda olhando a corda colorida, eu me imaginei anil. Naquele momento eu não era nem azul nem deixava de ser. Eu era simplesmente anil. Como definir o anil? Um azul que se cansou de ser azul e resolveu se rebelar e trocar de nome. Era azul na sua essência, mas carregava uma tonalidade nova que azul nenhum jamais tivera.
Dizem que o olho humano, algumas vezes, não pode captar o anil. Ele passa despercebido em meio às outras cores. Não é nem primário, nem secundário, nem adiciona, nem subtrai. Tem gente que acha que anil nem é cor, nem mesmo na caixinha de trinta e seis. Talvez não seja mesmo. Talvez o anil seja uma mera invenção de Newton para completar o seu espectro perfeito. Sete dias, sete notas, sete cores. Que obsessão!
Obcecada estava eu a contar pingos e cores no céu. Sendo anil e querendo ser ora azul, ora violeta. A velha já me tinha escalado para fazer parte do arco-da-chuva ou seria do sol? Só sei que era um arco. Um arco-da-aliança no qual as cores coexistiam para alegrar o casamento da viúva, ou será do espanhol? Pensando bem, acho que o anil não me cai tão mal assim. Ser só azul é muito chato e violeta o tempo todo me daria uma canseira.
           A chuva puxou mais forte e venceu essa batalha. O sol envergonhado se escondeu por algum tempo. A corda se afrouxou aos poucos e sumiu em meio às gotas gordas que se uniam e agora batiam com muita força na minha janela. Cansada de intrometer em briga alheia, fechei a cortina e liguei a TV. Estava feliz por ser anil. Somente anil.

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